A abordagem territorial dos relatórios regionais do desenvolvimento humano lida à luz da sociologia latino-americana

El enfoque territorial de los informes regionales de desarrollo humano se ve a la luz de la sociología latinoamericana

The territorial approach to regional human development reports is viewed in the light of Latin American sociology

Fecha de recepción: 16 de noviembre de 2020 / Fecha de aprobación: 28 de diciembre de 2020

Maria José De Rezende1

 

Resumo

Por que analisar a ênfase territorial, presente nos RRDH-AL, à luz das reflexões de Fals Borda, Armando Bartra e Bacelar de Araújo? Tal análise evidencia que o ordenamento argumentativo presente nos documentos não pretende desvendar os processos que impedem a participação territorial local, como procuram fazer esses cientistas sociais, pretende sim construir estratégias em prol de políticas de desenvolvimento humano que envolvam vários segmentos sociais.

A hermenêutica sócio-histórica permite decifrar as diferenças entre as abordagens territoriais presentes nos RRDH-AL e as elencadas pelos cientistas estudados. Ainda que distintas e produzidas com objetivos diversos, tais abordagens são portadoras de significados compreensíveis se situados nos contextos políticos aos quais se referem.

As (des)semelhanças entre as abordagens territoriais, examinadas neste estudo, aparecem refletidas nas muitas formas distintas de construir prospecções de futuros possíveis e supostamente realizáveis.

As reflexões dos sociólogos latino-americanos, contemplados nesta investigação, possibilitam compreender que as narrativas, postas nos RRDH-AL, tanto esclarecem quanto obscurecem intencionalidades, práticas, posições políticas e interesses diversos.

Palavras-chaves: Desenvolvimento humano territorial, cientistas sociais, participação local.

 

Resumen

¿Por qué analizar el énfasis territorial, presente en el RRDH-AL, a la luz de las reflexiones de Fals Borda, Armando Bartra y Bacelar de Araújo? Tal análisis muestra que el orden argumentativo presente en los documentos no pretende develar los procesos que impiden la participación territorial local, como intentan hacer estos científicos sociales, sino construir estrategias a favor de políticas de desarrollo humano que involucren a diversos segmentos sociales.

La hermenéutica sociohistórica permite descifrar las diferencias entre los enfoques territoriales presentes en el RRDH-AL y los enumerados por los científicos estudiados. Aunque distintos y producidos para diferentes propósitos, estos enfoques tienen significados comprensibles si se sitúan en los contextos políticos a los que se refieren.

Las (des) similitudes entre los enfoques territoriales, examinadas en este estudio, aparecen reflejadas en las muchas formas diferentes de construir perspectivas de futuros posibles y supuestamente alcanzables.

Las reflexiones de los sociólogos latinoamericanos, contempladas en esta investigación, permiten entender que las narrativas, puestas en el RRDH-AL, aclaran y oscurecen intencionalidades, prácticas, posiciones políticas e intereses diversos.

Palabras clave: Desarrollo humano territorial, científicos sociales, participación local

 

Abstract

Why analyze the territorial emphasis, present in the RRDH-AL, in the light of the reflections of Fals Borda, Armando Bartra and Bacelar de Araújo? Such analysis shows that the argumentative order present in the documents does not intend to unveil the processes that prevent local territorial participation, as these social scientists try to do, but rather to build strategies in favor of human development policies that involve various social segments.

Socio-historical hermeneutics makes it possible to decipher the differences between the territorial approaches present in the RRDH-AL and those listed by the studied scientists. Although distinct and produced for different purposes, such approaches carry understandable meanings if situated in the political contexts to which they refer.

There are (un) similarities between the territorial approaches of the formulators of the RRDH-AL and those of the social scientists present in this study, which reflects in their ways of building prospects for possible and supposedly achievable futures.

The reflections of the Latin American sociologists, contemplated in this investigation, make it possible to understand that the narratives, put in the RRDH-AL-AL, both clarify and obscure intentions, practices, political stance and diverse interests.

Keywords: Territorial human development, social scientists, local participation

 

Introdução

Os Relatórios Regionais do Desenvolvimento Humano relacionados à América Latina (RRDH-AL) estão voltados para diagnosticar e prescrever políticas para o continente em diversas áreas (Saúde, educação, moradia, emprego, segurança entre outras). As análises das narrativas construídas por esses documentos revelam a tentativa de incorporação de uma multiplicidade de vozes, que são filtradas e rearranjadas de modo a criar pontos de conexões entre organismos internacionais, cientistas, lideranças políticas e organizações da sociedade civil.

Neste documento, pretende-se demonstrar, especialmente, como os formuladores e encampadores dos relatórios procuram, em suas propostas de desenvolvimento humano, articular as abordagens setoriais e territoriais. Essa articulação de prescrições setoriais e territoriais foi lida à luz das abordagens prospectivas de três cientistas sociais do continente: O. Fals Borda, A. Bartra e T. B. de Araújo.

A defesa, presente nos RRDH-AL, desta articulação traz consequências significativas para as prescrições de políticas tidas, pelos técnicos do PNUD, como essenciais para alterar as condições de pobreza e desigualdades na América Latina.

A organização dos Relatórios Globais do Desenvolvimento Humano – RDHs (PNUD/RDH 1990; 1997; 2001; 2003; 2010; 2015)2, bem como dos regionais (por continentes3 [PNUD/RRDH-AL, 2009-2010; 2009-2010ª, 2010; 2013-2014; 2016; 2016ª] ou regiões dentro deles [PNUD/RDH-M, 2009-2010]), é feita de tal forma que os seus conteúdos, apresentados de maneira quantitativa ou qualitativa, caminham sempre rumo a formulação - para utilizar uma expressão de Enrique Leff (2010) - de aconselhamentos prospectivos, os quais partem de uma dada realidade negadora de possibilidades de mudanças e constroem caminhos diversos, quase sempre idealizados.

Conforme indica Alberto Guerreiro Ramos (2009), há diversas perspectivas e modelos possibilistas, alimentados por “uma concepção de realidade histórico e social que a vê como o resultado permanente de uma tensão entre possibilidades objetivas e escolhas humanas” (Ramos, 2009, p.49). Desse modo, os aconselhamentos prospectivos podem derivar, ou não, de uma abordagem histórica de longa duração. Existem muitos debates sobre a natureza das proposições prescritivas em Norberto Bobbio (2003). A noção de prescrição prospectiva tem relação com esta discussão, uma vez que se busca decifrar o significado de uma dada lógica argumentativa, norteadora das narrativas postas nos RRDH-AL, em favor da construção de comandos de ações e de procedimentos influenciadores das práticas sociais de governantes e lideranças diversas da sociedade civil.

As prescrições prospectivas, geralmente, idealizam políticas, supostamente, capazes de vencer a aridez de uma realidade que, ao longo da história, tem descartado muitas das prospecções indicadas pelos formuladores dos RRDH-AL, os quais procuram elaborar uma narrativa sempre direcionada ao enfrentamento de uma parte dos desafios antepostos ao desenvolvimento social e humano, no continente. Os produtores e encampadores desses documentos vão idealizando caminhos que “as estratégias de poder, (...) a desigualdade social, a pobreza” (Leff, 2010, p.77), a violência, a concentração de riqueza, recursos e poder vão desfazendo inteiramente.

Todavia, não são apenas os proponentes dos RRDH-AL que se ocupam da formulação de um conjunto de diagnósticos sobre o presente e de prospecções para alcançar um futuro melhor, ocupam-se também muitos cientistas sociais. Octávio Ianni (2005) afirmava que o devir tem sido a principal preocupação dessa área de conhecimento (Ianni, 2001; 2011). Pode-se dizer que tanto os elaboradores dos relatórios quanto os cientistas sociais estão falando em futuridades. O que ocorre porque “la futuridad no se agota ni se realiza; es la posibilidad de que algo se realice” (Gatto, 2019).

Os textos que compõem os relatórios não possuem natureza e/ou pretensão acadêmica, possuem sim a intenção de influenciar governantes, organizações e associações da sociedade civil e lideranças políticas e comunitárias na busca de um agir em prol tanto do desenvolvimento humano quanto da melhoria dos Índices de Desenvolvimento Humano (IDH) e das metas denominadas Objetivos do Desenvolvimento sustentável (ODS). É, então, uma narrativa política com um foco bastante definido em relação ao que se pretende alcançar.

O objeto deste estudo são os aconselhamentos prospectivos, contidos nos RRDH-AL, acerca de uma necessária articulação, para formulação de políticas públicas e sociais e das abordagens setoriais e territoriais, que incluam os diferentes ciclos de vida. Os diagnósticos e as prescrições contidos nesses relatórios, encomendados ao Programa das Nações Unidas para o Desenvolvimento (PNUD) e por ele editados, referentes à América Latina, serão lidos à luz das abordagens prospectivas de alguns cientistas sociais (T. B. de Araújo, O. Fals Borda e A. Bartra), que têm apontado para a necessidade de estarem as políticas públicas e sociais ancoradas em territorialidades específicas.

Os elementos postos em tal objeto de estudo suscitam procedimentos metodológicos que sejam capazes de elucidar o significado político dos aconselhamentos prospectivos explicitados na articulação entre as abordagens setoriais e territoriais. Desse modo, num primeiro plano, será feita uma análise das estratégias de argumentação contidas nos RRDH-AL.

Parte-se do pressuposto de que tanto as narrativas contidas nos RRDH-AL quanto os textos dos cientistas sociais contemplados neste estudo são portadores de significados políticos a serem desvendados. Esta análise terá caráter histórico-hermenêutico o qual exige: a “elucidação hermenêutica de redes de significado; a investigação do contexto e forma de consciência prática; a identificação de limites da cognoscitividade [dos agentes sociais]; [e] a especificação das ordens institucionais” (Giddens, 1989, p.266) inviabilizadoras da execução de políticas promotoras do desenvolvimento humano. Merece destaque o fato dos formuladores dos RRDHs insistirem, com afinco, na detecção de condições políticas e institucionais para a aplicação de tais aconselhamentos propositivos na implantação e sustentação de políticas sociais em prol de melhorias capazes de alcançar os mais pobres.

Os cientistas mencionados neste estudo foram selecionados, entre muitos outros, porque eles partilham anseios por “realização e criação” (Ianni, 2005, p.1) de possibilidades de um devir que não se sabe, exatamente, qual será. A diferença fundamental entre as suas indicações e as que estão contidas nos RRDH-AL é que estas últimas, nos documentos do PNUD analisados, estão mais propensas a confundir a idealização “com o que existe observavelmente” (Elias, 1994, p.74).

Não obstante se considerar indispensável distinguir as formas de prospecções constantes nos RRDH-AL e aquelas presentes nos escritos desses cientistas que estão, de alguma forma, envolvidos com os debates acerca da imprescindibilidade de formulação de políticas e ações que levem em conta as singularidades territoriais, foi inevitável fazer algumas comparações entre os aconselhamentos prospectivos dos formuladores dos RRDH-AL e os dos cientistas sociais estudados.

Todavia, levou-se sempre em conta que as naturezas das narrativas contidas nos relatórios e daquelas que estão presentes nos escritos dos autores analisados são muito distintas e cumprem papéis diferentes. “A linguagem ocupa um papel central [já] que não existe conhecimento sociológico que não passe [pela] linguagem, [que tem de ser sempre] situada (...). Tudo o que é dito, é dito para alguém em algum lugar” (Melucci, 2005, p.33).

A análise das prospecções levou em consideração o contexto social e histórico no qual os produtores desses documentos elaboram seus diagnósticos e prescrições (Queiróz, 2008). Em A sociedade dos indivíduos (1994), Norbert Elias destaca o quão complexo é “o desafio de compreender, simultaneamente, os embates entre as muitas configurações, as suas relações de interdependências e os valores que dão significados a ações, ideias, discursos, práticas e procedimentos” (Rezende, 2015, p.37).

Esta abordagem não se restringiu, então, aos argumentos contidos nos RRDH-AL, uma vez que eles foram tomados como expressão de um dado momento e de um dado contexto histórico em que se deu a materialização de um conjunto de vozes e de valores em busca de algumas medidas políticas, factíveis ou não, cujo objetivo é reverter as condições de pobreza extrema e de abandono que atingem partes expressivas da população do continente.

 

As abordagens territoriais como lastros para análise dos aconselhamentos prospectivos constantes nos RRDH-AL das Nações Unidas

Existem prospecções políticas distintas nos escritos dos cientistas sociais (Tânia Bacelar de Araújo, Orlando Fals Borda e Armando Bartra) selecionados para este estudo. Há também diferenças teórico-metodológicas e políticas em seus escritos. Não estão sendo tomados seus estudos como um bloco monolítico de diagnósticos e prescrições. Devem-se considerar, ainda, suas posições singulares em relação às agendas propostas, ao longo das últimas décadas, pelas Nações Unidas. Alguns deles (Tânia Bacelar de Araújo e Orlando Fals Borda, por exemplo) têm maior proximidade com algumas pautas de agências especializadas do sistema das Nações Unidas, tal como a UNESCO (Organização das Nações Unidas para Ciência, Educação e Cultura) e com programas e institutos, como a UNRISD (Instituto de Investigações das Nações Unidas para o Desenvolvimento Social) e o PNUD (Programa das Nações Unidas para o Desenvolvimento).

Orlando Fals Borda atuou em projeto vinculado ao UNRISD (Instituto de Investigações das Nações Unidas para o Desenvolvimento social) junto a cooperativas rurais na Colômbia, Venezuela e Equador. Em sua pesquisa, ele detectou que essas associações acabavam por arrefecer mudanças substantivas na zona rural.

De certa forma, todos os pesquisadores latino-americanos, que serão mobilizados para a leitura do que propõem os RRDH-AL, a saber, a articulação das abordagens setorial e territorial de desenvolvimento humano, apresentam alguma forma de reconhecimento do papel das Nações Unidas no processo de produção e divulgação de dados e conhecimentos. Armando Bartra, por exemplo, no artigo Tempos turbulentos (2010), dá importância aos dados extraídos da FAO (Organização das Nações Unidas para a Agricultura e Alimentação).

Tânia Bacelar de Araújo teve também, ao longo de sua carreira, trabalhos relacionados com as agendas de alguns organismos internacionais, tanto que realizou atividades de consultoria e pesquisa para o Programa das Nações Unidas para o Desenvolvimento (PNUD) e para a Organização Internacional do Trabalho (OIT)4. Isso demonstra que não existia, de sua parte, recusa ao que era proposto por essas organizações. Não lhe eram estranhos também os meandros dos embates políticos expostos nas prescrições encaminhadas por esses órgãos. Outro dado relevante é que ela, em vários momentos, de suas discussões lança mão de dados quantitativos produzidos pelo PNUD (Bacelar de Araújo, 2012; 2017), o que demonstra que ela o reconhecia, da mesma forma que Bartra e Fals Borda, como detentor de informações relevantes acerca da vida social, econômica e política.

 

A articulação das abordagens setoriais e territoriais nos RRDH-AL lida à luz da abordagem territorial de Orlando Fals Borda

Pode-se aproximar da abordagem territorial de várias maneiras. Muitas vezes se chega a ela por meio da necessidade tanto de definir objetos e procedimentos de pesquisas, circunscritos a algumas territorialidades específicas, quanto de formular práticas, ações e intervenções políticas relacionadas a determinados espaços sociogeográficos. Todavia, cada vez mais, desde a década de 1980, se buscaram outros parâmetros socioculturais para se somarem à questão da espacialidade. Os textos intitulados Convivência e Segurança Cidadã: Guias de gestão territorial e participativa (PNUD/2016) e Uma estratégia para o desenvolvimento rural: desenvolvimento territorial participativo e negociado (FAO/DTPN, 2005) são exemplos de diretrizes para formular diagnósticos e prognósticos nos âmbitos regionais e locais. Nelas a circunscrição espacial é somada aos elementos socioculturais. Prevalece a ideia de que o território não é somente um quantum de municípios, de províncias, de estados, ou de outras formas de agregação de localidades específicas.

Assim, ao elemento espacial é acrescido o entendimento de que o território é o agrupamento de indivíduos, de grupos ou de configurações, que partilham sociabilidades, culturas, interesses, vida econômica, expectativas, perspectivas, motivações, disposições e formas de agir. Aos fatores objetivos são juntados outros de caráter subjetivo comumente presentes nas abordagens territoriais difundidas nos documentos da FAO e do PNUD, anteriormente mencionados.

O documento da FAO, mencionado no parágrafo anterior, foi tomado como orientador da perspectiva territorial participativa que aparece nos documentos do PNUD, incluindo-se, entre eles, os RDHs e os RRDHs. Os esteios das diretrizes propositivas assentam-se na busca das “relações existentes entre os atores locais e seus territórios, assim como as principais implicações” (FAO/DTPN, 2005, p.2) derivadas de tais vínculos e conexões. A espacialidade e os liames sociais construídos no seu interior ganham um papel fundamental. Grosso modo, não se deve desconsiderar que a espacialidade regional e local tem peso, ora maior ora menor, naquilo que se define como abordagem territorial.

Com traços distintos são as abordagens territoriais que têm o seu fundamento ancorado na ação política regional e local dos grupos sociais subalternizados. Ganhou corpo na América Latina, desde a década de 1970, uma demarcação territorial impulsionada pelo ativismo político gerador de metodologias participativas (Fals Borda, 1988; 2014; 2015) que vão orientar, conforme afirma Orlando Fals Borda (1985, p.18), as “convicciones en el campo de la acción social y política, en los niveles local e regional”.

A defesa de uma abordagem territorial inclusiva visa, então, “atacar aquellas exclusiones que trascienden las líneas de pobreza -incluidas la discriminación contra los pueblos indígenas y afrodescendientes de la región” (PNUD/RRDH-AL, 2016, p.3). A insistência em uma perspectiva multidimensional, já muito presente nos RDHs globais, ganha projeção nos relatórios regionais “con base en una mayor articulación horizontal (intersectorial) y vertical (interterritorial) de la política pública, y a lo largo del ciclo de vida de las personas” (Ibid). Isso tudo combinado com uma maior participação cidadã por meio de consultas populares, fóruns, conselhos e outros formatos de ação política. Note-se, então, que não se trata de uma territorialização alternativa

que se asume como cotidianeidad ascendente (...) lo que Edward Soja (1976) llama espacio vivido o de representación, donde las prácticas cotidianas de ciudadanía toman un sentido inverso al de la planificación que desciende desde las instituciones de la administración pública. Imbuidas de la fuerza que da el colectivo social, las prácticas cotidianas pugnan por ascender hacia los centros de decisión política para revertir la falta de participación en la conceptualización y normativización del espacio local (Zanca, 2007, p.31-32).

As prescrições contidas nos relatórios voltados para a América Latina se enquadram como ações de engenharia social e não como territorialização alternativa (Zanca, 2007). Por isso, os diagnósticos e os aconselhamentos prescritivos são constituídos da soma da perspectiva multidimensional, multissetorial, intersetorial e interterritorial e de elementos relacionados aos ciclos de vida das pessoas. Mesmo no interior de um território, tomado como espaço geográfico e de sociabilidades diversas, as pessoas, em razão de sua idade, vivenciam condições distintas que, segundo as prescrições contidas nos RRDH-AL, têm de ser levadas em conta na feitura de políticas de intervenção social. Da mesma maneira que se devem considerar as situações de gênero, de raça, de identidade, é preciso levar em conta também, insistem eles, o ciclo de vida em que as pessoas se encontram.

De certo modo, pode-se dizer que a estratégia territorial não tem centralidade. Ela é um complemento. Ou seja, as políticas públicas governamentais precisariam levá-la em conta nas novas arquiteturas de políticas que deveriam ser efetivadas no transcorrer do século XXI. Lembre-se que os produtores e encampadores dos relatórios regionais sobre a América Latina têm, como base de seus aconselhamentos prospectivos, o contexto de alguns países que, segundo eles, já vinham agindo, em suas políticas, de modo a encampar as sugestões de ações que pudessem promover o desenvolvimento humano.

Por isso, parte dessa arquitetura de políticas públicas que articulavam as esferas multissetorial, intersetorial e interterritorial já vinham sendo construídas, na América Latina, desde a década de 1990. Há empenho para construir uma narrativa positivando os processos sociais em curso no continente, após as ditaduras militares. Para os formuladores e divulgadores dos documentos já estavam presentes tanto “una mayor coordinación intersectorial entre los ministerios que poseen responsabilidades en las áreas de educación, salud, desarrollo social, urbanismo, y vivienda y planificación” (PNUD/RRDH-AL, 2016, p.22) quanto “una mayor articulación territorial para responder a la - etapas del ciclo de vida de las personas” (Ibid).

Em vista disso, os processos de democratização política em curso na América Latina já tinham conduzido a “una mayor participación ciudadana a lo largo del proceso de política pública-desde la definición de los problemas hasta el diseño de las intervenciones, la gestión, el monitoreo y la evaluación de resultados” (PNUD/RRDH, 2016, p.22). Persistia, assim, a necessidade de manter a articulação entre as estratégias setoriais e territoriais, uma vez que isso vinha sendo concretizado com resultados positivos, mediante procedimentos governamentais, como orçamento participativo, políticas de transferência de renda, políticas de desenvolvimento de atividades econômicas em determinadas regiões e setores específicos, e mediante incentivos à agricultura familiar e à expansão de determinados setores geradores de emprego. Veja-se o que consta no relatório de 2016:

Si bien el Plan Brasil sin Miseria se creó a partir del programa de transferencias condicionas Bolsa Familia, dicho Plan va más allá de la pura transferencia de ingresos articulándose con otras estrategias orientadas a promover el fortalecimiento de capacidades, la inclusión productiva y el acceso a activos (PNUD/RRDH-AL, 2016, p.62).

Em alguns momentos do RRDH-AL de 2016 consta que o Plano Brasil Sem Miséria5 era o melhor exemplo de “articulación multisectorial de la política pública, transcendiendo así el éxito de las transferencias condicionadas” (PNUD/RRDH-AL, 2016, p.62). Porém, esse plano não era somente multissetorial, era também um plano, diziam os preparadores desse relatório, com características territoriais, já que havia “el monitoreo de las metas pactadas con los entes territoriales en lo que respecta a los programas sociales” (Ibid).

Todos os elementos postos nessas considerações constantes no RRDH-AL, de 2016, apontam para uma visão de articulação setorial e territorial que se define como uma articulação feita entre as políticas de desenvolvimento e de controle, de políticas públicas, que articulavam tanto os âmbitos locais, regionais e nacionais quanto os setores de saúde, educação, trabalho, entre outros.

Por que os formuladores do RRDH-AL defendem uma estratégia territorial e setorial que se configura como obra de engenharia social? Pelo fato de suas prospecções terem, na sua essência, o objetivo de defender a canalização das ações e das participações de modo a repetir que as sinergias devem ser postas, nos âmbitos locais e regionais, para reiterar aquelas políticas consideradas, nos relatórios, como eficientes e exequíveis.

Em Orlando Fals Borda (1985; 1985ª; 2014; 2015), a ação metódica, entendida como ação política de conhecimento e de participação geradora de um entendimento profundo acerca das práticas compartilhadas entre todos os agentes envolvidos, no âmbito territorial, tem de enlaçar segmentos internos e externos à localidade na qual as ações se desenrolam. A geração de energias criativas e sempre modificadas pela experiência desse encontro entre agentes locais e não-locais só é possível numa relação de reconhecimento do sentir e do pensar do outro. Porém, isso não basta, pois é essencial a valorização do conhecimento, que as comunidades locais acumulam por muitas e muitas gerações.

Indaga-se: Seria possível imaginar a efetivação de uma estratégia territorial com essa natureza aventada por Fals Borda? Em Conocimiento y poder popular (1985ª, p.23) ele menciona o envolvimento da FAO, na década de 1980, e de outras organizações não-governamentais com as muitas experiências locais de execução de ações metódicas e participativas, que geram políticas beneficiadoras das demandas comunitárias. Todavia, a ação participativa territorial tem demonstrado que nenhum ganho é definitivo e que as relações de poder se tornam complexas em múltiplos níveis, para utilizar uma expressão de Norbert Elias (1999). Daí a necessidade da criatividade humana (Furtado, 1992) ser sempre dinâmica e pautada em ações metódicas, participativas – (metódicas no sentido de serem elas geradas, estudadas e planejadas no transcorrer das próprias experiências locais) - e capazes de ir superando as ações de engenharia social, visto que estas engessam as experiências participativas e as práticas delas derivadas.

Vale perguntar se as ações metódicas não podem também se converter em uma forma de engenharia social. Orlando Fals Borda (2007; 2014; 2015) parecia crer que não, mas desde que se fomentasse, junto ao “poder popular, la autonomia de los grupos de base, mediante organismos de trabajadores ya establecidos o en formación” (Fals Borda, 1985, p.23). Os métodos participativos, sempre renovados e não-impositivos, não se converteriam em ações de engenharia social engessadas por dogmas de qualquer natureza, somente se alimentassem, continuamente,

la potencialidad creadora de los azares6 de las luchas, de la espontaneidad y de la intuición de las masas, para ir organizando movimientos regionales sociales y políticos independientes (Fals Borda, 1990, p.89).

Mas, a ação era metódica porque era “indispensable erigir estructuras estables para instrumentar la acción” (Fals Borda, 1985, p.23). Assim, as ações metódicas podem resvalar para ações de engenharia social, se as energias criativas advindas das experiências participativas forem domadas e controladas em favor de uma crescente adesão ao que for estabelecido, por quaisquer agentes, sem um conhecimento profundo do modo de vivência dos grupos excluídos ou incluídos precariamente.

O não-convertimento das ações metódicas em técnicas de engenharia social é possível, se ocorrer um constante reforçamento “de naturaleza colectiva de la búsqueda del conocimiento” (Fals Borda, 1985, p.25) que permita “saber interactuar y organizarse” (Ibid), in loco, tanto para gerar “experiencias de la investigación participativa” (Ibid), quanto para levar adiante “cambios substantivos em las estructuras de la sociedad” (Ibid).

Ao lerem-se os RRDH-AL no que tange às suas prospecções de articulação setorial e territorial, na realização de políticas públicas, não se observam questionamentos críticos às relações de subordinação, que existem no âmbito local e regional. Este é um dos problemas que irá aparecer também ao se examinarem os aconselhamentos prospectivos à luz das discussões de Armando Bartra. A construção dos diagnósticos e prognósticos, por parte dos produtores dos RRDH-AL, bem como das estratégias narrativas, tendem a desviar-se dos desequilíbrios de poder e, portanto, das relações de subordinação. Problema que os técnicos, elaboradores do RDH de 2019 (PNUD/RDH, 2019), tentaram trazer à baila, adentrando talvez os relatórios regionais referentes à América Latina, no decorrer da década de 2020.

Nos aconselhamentos prospectivos, contidos nos RRDH-AL, feitos aos Estados e às organizações da sociedade civil, praticamente não há propostas de ações com vistas ao “rompimiento de las relaciones de subordinación” (Fals Borda, 1985, p.25). Os seus elaboradores incentivam a participação de acordo com um modelo em que não se enfrentam, de fato, os desequilíbrios de poder. Tentam, sim, amenizar os seus efeitos por meio de alguns ganhos políticos que podem alcançar os segmentos excluídos.

Ainda que tais ganhos políticos não rompam com as relações de subordinação substantivamente arraigadas, os formuladores dos RRDHs insistem no caráter positivo da geração de alguma forma de participação. Abalos em tais condições de desequilíbrios de poder só seriam possíveis, conforme afirma Fals Borda, através tanto da dedicação coletiva aos trabalhos de “rescate de la historia regional y el empleo respetuoso de elementos de la cultura popular” (Fals Borda, 1985, p.25), quanto de um processo crescente de “dar voz a los silenciados y fomentar el juego pluralista de voces diferentes, a veces discordantes”7 (Fals Borda, 1990, p.89). E não se deve imaginar que os resultados positivos do rompimento, se bem que parcial, das relações subordinativas só seriam detectados no âmbito simbólico, tais resultados propiciariam também melhorias nas condições de vida material.

No concernente aos elementos simbólicos, registre-se que os elaboradores do RRDH-AL, de 2016, mencionam, algumas vezes, Cornelius Castoriadis (1975) em suas discussões sobre práticas sociais, normas, valores, procedimentos, comportamentos e instituições. Há nesse tipo de reflexão algumas similaridades com as discussões de Orlando Fals Borda (1988; 2017). No texto El campesino Cundi-Boyacense: conceptos sobre su pasividad (1956), o sociólogo colombiano demonstrava que os valores dos camponeses estavam na base de suas atividades sociais e políticas. Tanto os produtores do RRDH-AL quanto ele, por caminhos distintos, reiteram a importância desses elementos imaginários ou simbólicos na discussão sobre os (des)caminhos das mudanças pelas quais deveriam passar o continente.

 

A articulação das abordagens setoriais e territoriais nos RRDH-AL lida à luz da abordagem territorial de Armando Bartra

A abordagem territorial presente nos relatórios do desenvolvimento humano voltados para a América Latina parte do seguinte pressuposto: “el contexto territorial se mide (…), mediante el grado de cohesión social” (RRDH, 2016, p.101). Os diagnósticos e as prescrições, quando situadas não só espacialmente, mas também socialmente - conforme insistem os elaboradores dos referidos documentos, ao dizerem que o território é formado por sociabilidades diversas que agregam elementos materiais e imateriais (simbólicos) – indicam a possibilidade de seguir dois caminhos: a) aquele que destaca uma demarcação territorial em razão da integração e da coesão social, conforme se observa nos RRDH-AL e b) aquele no qual o território é pensado, muito mais em razão dos conflitos e exploração de alguns segmentos, pelos mais abastados, e dos desequilíbrios de poder, que campeiam por muitas localidades espaciais, sejam elas locais ou regionais.

O caminho trilhado pelos elaboradores dos RRDHs tende ao esvaziamento das tensões provocadas por processos de exploração econômicos e políticos situados em todas as territorialidades. Fixam-se, muito mais, nas denúncias sobre a ausência de “servicios básicos y seguridad alimentaria, y calidad del hábitat, que componen las dimensiones de la pobreza multidimensional” (PNUD/RRDH-AL, 2016, p.105) de uma dada região ou agrupamentos dentro delas por razões diversas (econômicas, políticas, identitárias, culturais). Os seus formuladores sugerem políticas públicas intersetoriais e interterritoriais para resolver tal deficit de serviços públicos.

Armando Bartra (2015; 2014; 2014ª, 2010; 2005) tem tentado demonstrar não só a importância da abordagem territorial mas também a necessidade de não mistificá-la. Em diversas situações tem-se a impressão de que, nos RRDHs, ocorre essa mistificação. E por quê? Para o sociólogo mexicano, o território tem de ser tomado como lócus de exploração econômica e do trabalho, e também como o lugar onde se manifesta a concentração de poder. É preciso, por isso, desmistificar a ideia de território como algo coeso e harmônico. Ele é o lócus do conflito e da contínua tentativa dos detentores do poder de impor uma determinada dinâmica social. Todavia, Armando Bartra deixa explicitado, em seus textos, que não se deve esquecer que o território é o lócus também de resistências diversas e dos intentos de construir espaços participativos carregados de sentidos e significados.

Todo aconselhamento prospectivo presente nos RRDH-AL exalta a participação cidadã como forma de fazer que haja articulação setorial e territorial no planejamento e execução de políticas públicas. Contudo, os seus formuladores constroem uma narrativa que se vai afastando dos desequilíbrios de poder vigentes nessas localidades definidas como espaços territoriais.

Os seus elaboradores advogam a necessidade de “definir los contenidos prioritarios de la política social, y distribuir en los niveles territorial y sectorial la inversión pública de acuerdo con las dimensiones que presentan mayores privaciones” (PNUD/RRDH, 2016, p.105), bem como a possibilidade de “reducir desigualdades, al permitir la focalización de las acciones en los grupos poblacionales o las áreas geográficas en que se concentra una mayor incidencia o intensidad de la pobreza” (Ibid). Além disso, outro ponto destacado é a elaboração de “metas de gobierno que articulen la gestión de diversas instituciones con base en los indicadores multidimensionales” (Ibid).

Conquanto tais prescrições sejam de fato relevantes, nota-se uma centralidade das prospecções no combate à pobreza multidimensional, o que é, sem dúvida, um avanço em relação às propostas que consideram a pobreza como resultado exclusivo de renda insuficiente ou inexistente. Posto que seja positivo indicar políticas públicas que levem em conta o caráter multidimensional da miserabilidade, fica-se sempre com a impressão, ao lerem-se os RRDH-AL, que os seus proponentes vão construindo formas de se esquivarem dos enfrentamentos políticos de grande monta, que toda ação multidimensional implica. Pode-se perguntar: Como planejar e operar tais ações em situações de extremas desigualdades de poder e de riqueza?

Celso Furtado (1997; 1997ª) demonstrou o quanto o combate à pobreza e à miserabilidade, em territórios dominados por desequilíbrios extremos de poder, é uma tarefa dificílima e passa por enfrentamentos políticos, pois os segmentos que concentram, em suas mãos, riqueza, controle de recursos do Estado e poder lutam, de modo renhido, para manter suas posições de poder. À frente da Operação Nordeste e da SUDENE (Superintendência do Desenvolvimento do Nordeste) ele registrou (Furtado, 1997b; 1959; 1964) as dificuldades, os embates e os desafios para viabilizar a construção da participação política em contextos marcados pelo caráter irrefreável, indomado e desmedido do poder daqueles setores que concentram em suas mãos os processos decisórios. Isso se passa não somente numa ou noutra espacialidade territorial da América Latina, mas está presente, de forma difusa pelo continente como um todo.

Celso Furtado, assim como Armando Bartra (2015ª), deixa registrado que as propostas de melhorias sociais, centradas em territorialidades específicas, têm de considerar, em primeiro plano, a densidade e a complexidade das relações de poder existentes em seu interior. Alerta-se para isso porque “há uma estrutura complexa de controle político-ideológico e de exploração”, (Bartra, 2015ª, p.44) no âmbito local ou regional. Quando não se levam em conta as configurações de poder e as forças preponderantes, que anulam todo intento de políticas sociais distributivas de renda, recursos e poder de decisão, nota-se a ocorrência de mistificação não somente do território, mas também da participação cidadã tão sobejamente mencionada nos RRDH-AL.

Insistem os elaboradores dos RRDH-AL muito mais no fato de que as vulnerabilidades serão mais bem decifradas se forem situadas no âmbito territorial, entendido aqui como o espaço local onde as pessoas vivem (PNUD/RRDH-AL, 2016). Por essa razão, o território é tido como o lócus no qual as políticas públicas irão planejar e executar ações de combate às exclusões multidimensionais, mas é, também, o espaço onde alguns povos podem travar uma luta política por seus direitos, por seu sustento, como é o caso dos indígenas. Assim, os “derechos territoriales, políticos, culturales, económicos y sociales” (PNUD/RRDH-AL, 2016, p.169) estão juntos e podem se constituir em pano de fundo para processos de resistência em busca de direitos. Isso demonstra que, de algum modo, o território é tomado, em determinada condições, como espaço de resistência.

A defesa da participação cidadã no interior dos relatórios para a América Latina abrange duas questões: a resistência em prol dos direitos dos povos indígenas e afrodescendentes e as mudanças nas relações de poder como forma de criar outras sociabilidades e novas institucionalidades. “Los cambios sistémicos y estructurales requieren que se produzcan cambios en las relaciones de poder, en la calidad de las instituciones y en el patrón extractivista de producción económica, para cuyo logro la voz de la ciudadanía es fundamental” (PNUD/RRDH-AL, p.192).

Reconhece-se então, nessa passagem, que as políticas de resistência protestam contra os desequilíbrios de poder. Todavia, a narrativa é produzida com o intuito de fazer parecer que é, inteiramente, exequível converter essas resistências por direitos em mudanças substantivas nas relações de poder. E por que pareciam tais políticas de mudanças realizáveis? Porque consideravam os seus formuladores que elas já vinham ocorrendo. Segundo os produtores do RRDH-AL de 201/6, isso poderia ser deduzido da constatação de que “política pública más cercana a las personas (...) ya se inició en algunos países de la región” (RRDH, 2016, p.192).

Os formuladores tanto dos RDHs globais quanto dos regionais indicam que as possibilidades de mudanças substantivas, nas relações de poder, eram constatáveis graças às políticas públicas que vinham sendo realizadas em alguns países. O Brasil estava entre eles. Partiam do pressuposto de que a sociedade civil organizada estava participando na geração de demandas e controles de tais políticas sociais. Não há dúvida de que se operava, assim, uma confusão entre o ideal e a realidade.

Ao construírem essa idealização os formuladores dos RRDH-AL passavam ao largo de um processo histórico de concentração de riqueza e de poder nos espaços locais e regionais. Mencionavam as muitas possibilidades de expandir as ações participativas, mas, conforme pergunta Bartra (2015ª.), como isso seria possível em localidades onde vigorava o caciquismo? Segundo ele, a luta pela existência, pelo sustento, pela vida, pela participação política, enfim, é dificílima e necessária. Portanto, todas as vezes que se tenta fazer parecer que tais lutas, desde que trazidas para o âmbito territorial (pensado este como espaço físico e social), são politicamente realizáveis, sem grandes enfrentamentos ao poder prevalecente nessas localidades, cometem-se enganos ingentes.

Todas as participações geradoras de demandas coletivas, no entender de Bartra, são vigiadas pelos segmentos poderosos locais e regionais. As forças sociais preponderantes buscam, de todo modo, entravar não só as lutas por melhorias materiais (bens para sobrevivência, como terra, água, alimentos), mas também aquelas pelas quais se empenha em fazer valer direitos de alguns grupos (tais como dos camponeses pobres, dos indígenas etc.).

Armando Bartra (2014) nos diz que há territórios simbólicos e também lutas territoriais simbólicas (por manutenção de tradições, valores, crenças e direitos). Os formuladores do RRDH-AL 2009-2010 também dizem que os territórios podem, sim, ser demarcados em razão de elementos simbólicos, ou seja, crenças em suposta inferioridade de pessoas que vivem em uma dada localidade, bairro, região. Isso leva a sentimentos de desprezo em relação a grupos sociais inteiros. No caso dos pobres, dos negros, dos índios, dos migrantes, entre outros, são nítidos, muitas vezes, os “estigmas territoriales (Barrios, ciudades) y sociales (migrantes, jovens)” (PNUD/RRDH-AL, 2009-2010, p.304).

De que modo, os formuladores dos RRDH-AL manejam tais complexidades políticas, existentes nos territórios, mencionadas por Bartra? Lidam invocando “aplicación del principio de subsidiariedad” (PNUD/RRDH-AL, 2016, p.193), o qual favoreceria uma “articulación territorial vertical entre distintos niveles de las administraciones públicas (nacional, intermedio y local)” (Ibid). Para eles, a subsidiariedade seria um arranjo com potencial para democratizar a relação entre o Estado e a sociedade.

A subsidiariedade, mencionada nesses documentos, parece ser uma forma de associação, por meio de convênios, entre as agências do Estado e as organizações da sociedade civil para aplicação de leis que viabilizem direitos e serviços públicos a grupos populacionais específicos. Como exemplo, podem-se mencionar as colaborações de atores e agentes diversos (governamentais locais e centrais, não-governamentais (ONGs, sindicatos, associações), intergovernamentais (OIT8, PNUD, UNESCO9), entre outros) para resolver problemas que exigem atos subsidiários10. Outro exemplo, são os sindicatos e as associações dos trabalhadores rurais de regiões longínquas que podem ser conveniados com as agências governamentais para facilitar a concessão de direitos aos trabalhadores, isto é, reunindo documentos, digitalizando, montando processos de aposentadorias, pensões, entre outros, para aqueles trabalhadores sem condições de lidar com o mundo digital, que exige rigidez nos procedimentos burocráticos, além de outras exigências11.

Para que o principio da subsidiariedade seja aplicado é preciso “un protagonismo renovado de los ámbitos subnacionales en la construcción de soluciones adaptadas al territorio y a poblaciones específicas” (PNUD/RRDH-AL, 2016, p.193). Demandaria, também, nos âmbitos locais, “un incremento de sus capacidades técnicas y presupuestarias para abordar los retos del desarrollo, y sobre todo aquellos ligados con la erradicación de exclusiones duras” (Ibid). Nada disso se converte em melhorias para os mais pobres, se eles não vivenciarem uma condição cidadã plena, ou seja, se não forem empoderados, habilitados e capacitados, como atores sociais, para gerar e sustentar demandas por seus direitos.

Obviamente, o espaço local ou subnacional não está sendo pensado pelos formuladores dos RRDH-AL, como pensa Bartra, para quem o território é o lugar, por excelência, de uma identidade política “coherente y unitaria” (Bartra, 2014, p.3) e capaz de estabelecer processos de resistência a todas as formas de opressão e exclusões sociais sedimentadas pelo colonialismo cultural, econômico e político. Ser a identidade política unitária e coerente não significa que ela não envolva “setores sociais muito diversos” (Bartra, 2017 apud Barcellos, 2017, p.2).

O desenvolvimento territorial alternativo só o é, de fato, se conseguir impulsionar ações políticas, econômicas e por direitos (Bartra, 2005). Note-se, então, que as propostas de desenvolvimento humano para a América Latina combinam uma base, firmemente, ancorada nos aconselhamentos prospectivos, de desenvolvimento social, gerados, desde meados da década de 1950, na América Latina, com alguns traços modificados das prescrições de desenvolvimento alternativo. A tentativa, dos proponentes dos RRDH-AL, de abraçar uma perspectiva territorial está no centro dessa combinação que se materializa em propostas que anuviam os exorbitantes desequilíbrios de poder que anulam as, ainda que remotas, possibilidades de desenvolvimento social e humano no continente.

 

A articulação das abordagens setoriais e territoriais nos RRDH-AL lida à luz da abordagem de Tânia Bacelar de Araújo

As análises prospectivas da economista Tânia Bacelar de Araújo (2012ª; 2010; 2010ª; 1999) sobre desenvolvimento territorial no Brasil possibilitam tecer um diálogo mais rente, mais condizente com os aconselhamentos prescritivos contidos nos relatórios regionais voltados para a América Latina. E, por que há essa possibilidade? Pelo fato de que ela esteve envolvida no planejamento e operacionalização de políticas focadas em regiões e/ou territórios e que, de certa forma, tais políticas dialogavam com os diagnósticos e prescrições sugeridos aos Estados nacionais pelo PNUD.

Não há dúvida de que algumas políticas - em que ela tomou parte, durante o governo Lula da Silva - muitas vezes dialogavam com as prescrições feitas em programas e agências das Nações Unidas. No governo Lula da Silva (2003-2010), ela atuou no Ministério de Integração Regional, como secretária de Políticas Regionais; atuou também no Conselho de Desenvolvimento Social e Econômico da Presidência da República. Mas não só, já que ocupou cargos em administrações públicas estaduais (Pernambuco) e municipais (Recife).

Ao lerem-se suas entrevistas e textos diversos, percebem-se, em vários momentos, algumas posições que têm similaridades com as prescrições contidas nos RDHs e nos RRDH-AL. Entre elas podem-se listar as seguintes: a) a articulação entre abordagens setoriais e territoriais, desde que “a força dos territórios consi[ga] articular as ações dos governos em torno de objetivos negociados em cada lugar” (Bacelar de Araújo, 2010, p.205); b) a importância dos agentes locais na construção de um desenvolvimento mais inclusivo; c) a necessária articulação entre as esferas nacionais, regionais e locais (Ibid, p.203) para construir estratégias que levem a projetos de melhorias aos mais pobres; d) a necessidade de sempre ter em vista que o espaço local deve ser valorizado enfaticamente no processo de elaboração das políticas; e) a participação política territorial, que deve possibilitar a geração de agentes locais dotados de capacidade de interferir no processo de desenvolvimento regional (Ibid, p.199); f) a busca de convergência entre “políticas públicas e empresariais” (Ibid) na construção de estratégias de mudanças; g) a necessidade de que o Estado venha a “apoiar iniciativas (...) convergentes” (Ibid) com as propostas oriundas da sociedade civil organizada; h) a importância de gerar laços sociais entre os mais diversos agentes de uma territorialidade específica “(sindicatos, organizações da sociedade civil, agentes do Estado, empresários, universidades, entre outros)” (Ibid, p.200); i) a urgência da “descentralização das políticas públicas, inclusive para que o controle social se faça com maior eficácia” (Ibid, p.201).

É notável a similaridade entre várias de suas posições e as sistematizadas no interior dos Relatórios Regionais do desenvolvimento humano referentes à América Latina. Os formuladores dos RRDH-AL são enfáticos quanto à necessidade, por exemplo, de articulação tanto entre as esferas nacionais, regionais e locais quanto entre as de cunho setorial e territorial, ao mesmo tempo. Eles o são também em relação à descentralização de estratégias para ampliar as chances do desenvolvimento humano, o que não significava, como dizem eles, desenhar políticas territorializadas e descoladas dos planejamentos e objetivos nacionais.

A participação dos diversos agentes governamentais e não-governamentais, bem como o investimento, o planejamento, a execução de políticas sociais deveriam, segundo os formuladores dos RRDH-AL, ser escalares. Ou seja, a implementação e a participação dos agentes seriam dados por escalas que vão do âmbito nacional até o local. Este último pode ser o município ou uma junção de municípios formadores de uma territorialidade específica. “Por sencillas razones de escala, la participación ciudadana es más posible y más eficaz en las instancias locales” (PNUD/RRDH-AL, 2009-2010, p.282). Essa perspectiva escalar está também presente na abordagem territorial abraçada por Tânia Bacelar de Araújo (2010, p.205), para a qual “o desenvolvimento territorial pressupõe projeto regional e (que) os agentes de outras escalas não devem desconhecê-lo”12.

Embora considere que a possibilidade de ampliação da condição cidadã e da democratização do espaço local esteja no núcleo do desenvolvimento territorial, Bacelar de Araújo destaca as diferenças existentes entre os territórios. Nem sempre a participação nos espaços locais é, de fato, eficaz. Há aqueles com maior potencial de geração de um desenvolvimento participativo, há também aqueles com menor potencial. São muitas, conforme ela acentua, as diferenças entre as localidades, as quais podem guardar, em seu interior, maior histórico de repertórios participativos.

As regiões, ou espacialidades regionais, possuem, então, singularidades que vão desde as tensões e os conflitos geradores de violências, inibidoras, estas por sua vez, da criação de agentes sociais desejosos de participar, até as condições tensivas que podem, ou não, desaguar em processos de maior participação. Constata-se, assim, que a análise de Bacelar de Araújo está mais enraizada nos contextos específicos em que ela atuou como agente governamental.

Os elaboradores dos RRDH-AL constroem uma narrativa que visa servir como aconselhamento prospectivo para várias partes do continente e isso leva a abordagens mais generalistas. No caso de Bacelar de Araújo, nota-se que lhe foi possível, de um modo ou de outro, testar a abordagem territorial participativa in loco devido a sua maior precisão acerca da potencialidade, (caso exista), da geração de agentes, agendas e políticas para um maior controle das pessoas nas políticas de desenvolvimento regional.

Há, no entanto, algo muito similar entre as propostas de Bacelar de Araújo e a dos formuladores dos RRDH-AL no que diz respeito a necessidade de envolver, na busca pelo desenvolvimento territorial participativo, uma multiplicidade de atores sociais, desde os nacionais aos locais. As propostas constantes nos RRDH-AL defendem, tal como a economista em estudo, uma

articulación vertical entre los distintos niveles de las administraciones públicas y con el resto de los actores sociales y económicos, especialmente en aquellos países de la región que cuentan con un territorio amplio, con una alta proporción de población rural y con múltiples niveles de administración pública para la organización territorial (PNUD/RRDH, 2016, p.196).

Não obstante ser imprescindível a existência dessa articulação entre as várias dimensões do poder público, tal como aparece nos escritos da citada autora e nos RRDHs, observa-se que tanto nestes, quanto naqueles, ganha proeminência a indispensabilidade de o desenvolvimento regional ter um lugar de destaque na agenda pública. Há convergência entre as posições dessa escritora e as dos formuladores dos RRDHs sobre a relevância de valorizar, na América Latina, em tempos de globalização, a agricultura familiar como um modo de combater a pobreza, a fome, a exclusão e o desemprego. No RRDH-AL, de 2010, seus formuladores, ao mencionarem o relatório do desenvolvimento humano, de 2008, referente à Bolívia, intitulado La otra frontera, davam destaque ao papel da agricultura familiar orgânica, como aquela “que genera empleo conservando el medio ambiente y mejorando los estándares laborales” (PNUD/RRDH-AL- 2010, p.160).

Essa ideia de que a agricultura familiar gera empregos e favorece a expansão de outra lógica econômica está presente também nos escritos da cientista social discutida neste tópico. Porém, há diferenças substantivas no modo de Bacelar de Araújo (2010ª) tratar a questão, uma vez que ela não só considera a agricultura familiar como um modelo para a solução do emprego, da produção de alimentos e da construção de uma sociedade mais equânime e mais justa, mas também como uma forma de contraposição entre esse tipo de agricultura e a agricultura patronal que tem perpetuado o aprofundamento do desemprego, utilizando tecnologias diversas, bem como toda forma de injustiça e desigualdades sociais e políticas. Os produtores dos RRDH-AL não vão tão longe, já que estão sempre contemporizando para evitar tocar nos processos de enfrentamentos políticos e de interesses econômicos sedimentados nos âmbitos locais e regionais.

Há, certamente, algo que se deve observar com cuidado: enquanto os produtores dos RRDH-AL constroem uma narrativa distante dos embates políticos locais suscitadores de enfrentamentos, que revelam conflitos insolúveis, Bacelar de Araújo faz questão de ressaltar que, em última instância, o desenvolvimento regional que impulsionaria, ao mesmo tempo, a agricultura familiar, era, a médio e a longo prazo, uma forma de combater os enormes desequilíbrios de poder existentes na sociedade brasileira. A agricultura familiar não tinha, como única finalidade, a geração de mais empregos, ela deveria, além disso, potencializar a participação política local como uma forma de estimular procedimentos democráticos capazes de promover maior justiça social.

A expansão de atividades econômicas com capacidades mobilizadoras de comunidades locais parece muito bem vista pelos produtores dos RRDHs. Nesses documentos, há uma exaltação da ideia de comunidade como base para “introducir el ideario de la democracia participativa tanto en los barrios populares como en las luchas por el acceso a la tierra y la reforma agraria para los pequeños productores familiares” (PNUD/RDH-M, 2009-2010, p.227).

A valorização do agente local (Bacelar de Araújo, 2010) e da agricultura familiar aparece também como indispensável nos escritos da cientista social brasileira. Ela enxerga tal processo de dar voz aos grupos locais – desconsiderados politicamente, ao longo da história - como capaz de fazer avançar a construção democrática. E, de que maneira isso ocorreria? Em primeiro lugar, os agentes sociais locais, ligados à agricultura familiar, deveriam ter a possibilidade de discutir e de participar da formulação de políticas sociais dentro de um dado espaço específico que iria se alargando até as esferas públicas mais amplas.

E, isso só seria possível por meio de “articulações (...) complexas entre instâncias locais e nacionais” (Bacelar de Araújo, 2010, p.203). Dessas articulações poderiam surgir “novas institucionalidades” (Bacelar de Araújo, 2009-2010, p.199) como construtoras de processos capazes de reconhecer a condição cidadã dos diversos segmentos sociais presentes em um dado território. Para os elaboradores do RRDH-AL-2016, essas institucionalidades renovadas que derivariam da “generación de confianza en el Estado y en el sistema democrático [resultarian cruciales] para las dinámicas de progreso multidimensional” (PNUD/RRDH AL, 2016 p.197).

Destaque-se que os formuladores do RRDH-AL (2009-2010) exaltam o atendimento primordial dado, na América Latina, por uma parte de seus governantes, para as políticas de “seguridad ciudadana” (RRDH-2009-2010, p.306). A atuação de T. B. de Araújo, no início do século XXI, como técnica na Secretaria Nacional de Políticas Regionais do Ministério da Integração Nacional, grosso modo, parece ter algumas similaridades com aquilo que o PNUD prescrevia nos seus Relatórios Regionais do Desenvolvimento Humano. Todavia, a checagem minuciosa de tal semelhança passa por exames detalhados tanto das práticas e das ações implantadas pelas políticas regionais quanto dos aconselhamentos propositivos contidos nos RRDH-AL. Pode-se dizer, então, que há indícios de similaridades, os quais, todavia, teriam de ser mais bem investigados.

Os formuladores dos RRDH-AL pretendem dar centralidade à necessidade de construção da participação dos destituídos de poder e dos mais pobres nas comunidades tanto rurais quanto urbanas. A atuação política estava, então, vinculada a “la pertenencia espacial y [a] la vivencia de ciertas carencias comunes” (PNUD/RDH-M, 2009-2010, p.227). Seria isso que demandavam, segundo eles, os movimentos sociais. Esses aconselhamentos prospectivos para que haja mais demandas de participação por parte de grupos locais nos espaços urbanos e rurais podem ser lidos como tendo certa similaridade com o que defendia Bacelar de Araújo (2010, p.205), ou seja, com uma “abordagem holística [que visava] mobilizar um conjunto mais amplo de agentes nos territórios” rurais e urbanos.

 

Aspectos dessemelhantes entre as ideias e práticas sugeridas por B. de Araújo e os aconselhamentos prospectivos presentes nos RRDH-AL

As narrativas que se leem nos relatórios, não somente aqueles voltados para a América Latina, alinhavam inúmeras sugestões e propostas de desenvolvimento humano, que pressupõem mudanças econômicas e políticas de amplas magnitudes. As construções argumentativas amenizam, de maneira ora mais ora menos sutil, os conflitos e os desequilíbrios de poder de modo que fazem parecer que os ingentes e imprescindíveis câmbios sociais e políticos são, em última instância, exequíveis. Veja-se o que consta num dos documentos analisados:

Debido al déficit que un Estado tradicionalmente agazapado en los niveles centrales presenta en lo que respecta a su llegada al territorio, existe hoy en día en la región un interés muy fuerte y renovado en las políticas territoriales que permitan acercar los bienes y servicios públicos a las personas (PNUD/RRDH-AL, 2016, p.198).

Levando-se em conta o modo como se organizam os poderes locais na América Latina, pode-se perguntar: Quem teria muito interesse em desenvolver políticas territoriais participativas? Como as elites locais, que controlam, muitas vezes de modo draconiano, as diversas esferas do poder político se tornariam interessadas na renovação da forma de operacionalizar a vida pública num dado território? De que maneira os grupos invisibilizados, excluídos e marginalizados poderiam se aproximar dos processos decisórios e mudar as agendas e execuções de políticas sociais locais?

Note-se a existência de uma narrativa que faz parecer existir uma harmonização de interesses no âmbito local, onde todos os interesses confluem para um mesmo objetivo: fazer que os muitos agentes que compõem o poder local atuem em favor das políticas sociais territoriais favorecedoras dos mais pobres, dos mais vulneráveis e dos mais excluídos. É como se não houvesse resistências daqueles setores que controlam as instâncias locais de poder de decisão. Essa visão idílica é facilmente encontrada ao longo dos RDHs e dos RRDH-AL. Destaca-se expressivamente um suposto caráter integrador do espaço territorial local.

El territorio no es (…) debe tener un carácter integrador que cubra y dinamice todas las dimensiones del desarrollo humano (ambiental, política, económica, social y cultural) y todos los actores territoriales (instituciones públicas, sociedad civil y sector privado) (PNUD/RRDH-AL 2016, p.198).

Passando, propositalmente, ao largo dos conflitos de interesses, das resistências, dos controles draconianos sobre instâncias de poder e instituições, bem como das imposições dos principais centros de decisão – e utilizando um sintagma muito presente na obra de Celso Furtado (1997; 1997ª; 1997b) - nos âmbitos locais e regionais, amenizando, enfim, as violências que destroem as tentativas de participação dos alijados da vida política local, os formuladores dos RRDH-AL empenham-se em atestar a vigência de uma solidariedade territorial que parece, segundo eles, adormecida, mas que poderia ser ativada para uma melhor distribuição dos recursos orçamentários em favor do combate à pobreza e às desigualdades (PNUD/RRDH-AL, 2016, p.199).

É em razão da existência de uma suposta solidariedade nos âmbitos locais, que os aconselhamentos prospectivos vão caminhando rumo a uma proposta central dos documentos: a instauração de processos de governança, a qual instauraria uma nova arquitetura institucional, ou seja, “horizontal, que se basa en los procesos de articulación intersectorial, y otro vertical, que se funda en la articulación territorial multinivel” (PNUD/RRDH, 2016, p.202).

 

Conclusão

De um lado, tem-se, então, por parte dos proponentes dos RRDH-AL, uma prospecção de mudança social assentada num exercício de engenharia social e, de outro, inúmeras sugestões prospectivas dos cientistas sociais empenhados em indicar caminhos possíveis em meio ao desafio de “compreender ou explicar as realizações e os impasses, as condições e as possibilidades, as frustrações e as ilusões que marcam e demarcam a história” (Ianni, 2005, p.1) latino-americana. Os cientistas sociais arrolados neste estudo tecem suas prospecções de mudanças “como um processo liberador de energias criativas e não como um trabalho de engenharia social13 em que tudo está previamente estabelecido” (Furtado, 1992, p.75).

Os aconselhamentos propositivos, contidos nos RRDH-AL, podem ser definidos como engenharia social porque são traçados percursos de ações e de práticas concebidas como geradoras de processos de expansão do desenvolvimento humano. Subtrai-se delas (ações e práticas) todo um “movimento pendular interminável, entre o realista e o amargo, a decepção e o ilusório, o histórico e o ideológico” (Ianni, 2005, p.1). Os diagnósticos e as prescrições passam sempre a ideia de que é possível controlar todos os movimentos e processos que, supostamente, levarão à ampliação do desenvolvimento humano no continente. Mesmo diante de algumas situações, como é o caso do agravamento brutal da pobreza e da violência extrema, em algumas partes do continente, os produtores dos relatórios tendem a advogar soluções em que ficam evidentes constructos ideológicos tecidos por uma confusão entre o ideal e a realidade (Elias, 1994).

Não se deve imaginar, porém, que os formuladores dos RRDH-AL constroem seus diagnósticos e prognósticos de modo, inteiramente, alheio aos debates sociológicos feitos no continente. Pode-se mencionar, por exemplo, a metodologia de investigação participativa de Fals Borda e seus seguidores que parecem inspirar alguns técnicos ligados aos organismos internacionais que passam a qualificar a intervenção territorial, para a geração de políticas de combate à pobreza e à exclusão, como participativa. Mas há, evidentemente, uma redefinição do que seria esse processo participativo no âmbito local. Ou seja, da proposta de participação é subtraída a essência, a qual pode ser definida como ativismo político. Conforme Fals Borda, esse ativismo deriva das aspirações populares, avessas aos controles impostos pelas orientações denominadas de engenharia social. Controles estes que escoram as prescrições de participação presentes nos RRDH-AL.

Os formuladores dos RRDH-AL não abraçam, integralmente, uma abordagem territorial. Há uma combinação da abordagem setorial e territorial. Seus aconselhamentos prospectivos têm os pés fincados em “una agenda basada en intervenciones multisectoriales, y cuyo centro de gravedad es la construcción de una universalidad efectiva de los derechos” (PNUD/RRDH-AL, 2016, p.3). Todavia, eles defendem que as abordagens setoriais e territoriais sejam articuladas para que os grupos sociais possam ser considerados dentro de suas singularidades sócio-históricas; neste caso, as vivências no interior de espacialidades específicas devem ser consideradas em conjunto com as necessidades de políticas setoriais diversas nas áreas de educação, saúde, habitação. Os diversos segmentos sociais devem ser tomados, então, como seres sociais que partilham necessidades materiais e imateriais inerentes à vida objetiva e subjetiva de cada um.

À luz dos escritos de Orlando Fals Borda, quando se analisam as indicações e aconselhamentos prospectivos, postos nos RRDH-AL, de valorização de estratégias territoriais, além das setoriais, se depara com uma prescrição-chave do sociólogo colombiano que pode ser resumida, de modo geral da seguinte maneira: somente quando as aspirações populares –detectadas por meio de metodologias de investigação participativa, consubstanciadas em experiências impulsionadoras de demandas políticas, culturais, econômicas e sociais– propiciam nos espaços regionais e locais, a implantação de políticas sociais, que contemplem as especificidades e as singularidades socio-histórica, socioantropológica e sociogeográfica, é que se tem, de fato, o poder participativo dos agentes populares considerados como essenciais para a implantação e manutenção de programas e políticas públicas.

Os aconselhamentos prospectivos, presentes nos RRDH-AL, em torno do desenvolvimento humano, lidos a partir da obra de Fals Borda (2014), buscam aperfeiçoar uma dada perspectiva de desenvolvimento que padece do mesmo problema de diversos outros modelos desenvolvimentistas alheios aos processos complexos de geração e manutenção da exclusão dos povos subalternizados latino-americanos. Toda e qualquer prescrição de melhoria coletiva teria de levar em conta, integralmente, as circunstâncias sociais que martirizam as populações invisibilizadas do continente.

A ação participativa territorial, para Fals Borda, teria então de formar, para utilizar uma expressão de Alberto Guerreiro Ramos (1996), o ser parentético, ou seja, aquele capaz de superar as limitações e os obstáculos impostos pelas circunstâncias desoladoras que envolvem parte expressiva de pessoas do continente. O emaranhado de fios políticos e ideológicos, componentes dos RRDH-AL, não possibilita que os aconselhamentos prospectivos lidem com desafios tão profundos, os quais estiveram sempre presentes na pesquisa-ação formulada pelo sociólogo colombiano.

Os produtores dos relatórios voltados para a América Latina veem o território como o lócus onde é possível aproximar segmentos sociais variados para estabelecer ações e práticas de expansão da cidadania participativa e garantidora de melhorias sociais. E, ainda que não haja, em cada um dos lócus, identidade política unitária e plenamente constituída, é possível que neles se consigam mudanças sociais relevantes. Em razão disso, “el eje de la interacción entre el Estado y la ciudadanía es clave para implementar una nueva arquitectura de las políticas públicas” (PNUD/RRDH, 2016, p.193).

Como os RRDH-AL estão voltados para pensar uma forma de desenvolvimento, é bom observar o tipo de olhar que Bartra (2005) lança aos modelos de desenvolvimentos sugeridos, impulsionados ou financiados pelos organismos internacionais. Segundo ele, quanto mais as ações coletivas exigiam, no limiar do século XXI, políticas e serviços públicos, mais os governantes procuravam se acercar de programas de desenvolvimento financiados por organismos internacionais (Bartra, 2005).

No seu entendimento, nas análises desses patrocínios, deve haver muito mais preocupação com os efeitos sociais e econômicos sobre os países recebedores de tais financiamentos, do que com a decifração das ideologias contidas no seu bojo. As dívidas impagáveis, as melhorias na infraestrutura, que só beneficiam os mais abastados, a tentativa de apagamento de tradições, as crenças e os valores de muitos grupos e a persistência dos processos de exclusão profundos devem ser estudados e pesquisados, para que haja um bom entendimento dos efeitos, nas várias territorialidades, dos projetos de desenvolvimento. Há riscos de muitos deles, no entender de Bartra (2005, p.117), reforçarem novas modalidades de “colonização selvagem”.

Não obstante, Bartra (2010) diz que não se trata, de modo algum, de sair em defesa de um neodesenvolvimento, como se fosse possível, na América Latina, ser pós-moderno. É, diz ele, absolutamente insustentável, atualmente, “el modo de estar en el mundo” (Bartra, 2010, p.113) reivindicado pelos neodesenvolvimentistas (Bartra, 2010). Não se trata de reiterar e/ou rejeitar este ou aquele modelo de desenvolvimento, trata-se sim de reanimar e potencializar as práxis coletivistas já existentes (Ibid).

Por esse caminho, Armando Bartra (2005) faz a defesa de um desenvolvimento alternativo gerado e gerido dentro das territorialidades específicas, o qual teria de ser sustentável e propulsor de empregos, à medida que expandisse o mercado interno. Tal desenvolvimento teria de ser capaz de potencializar a justiça social, as liberdades, a autonomia alimentar e os direitos humanos. No entanto, isto não pode ser alcançado sem mudanças nos parâmetros (concentração de rendas, recursos, renda, poder) que estruturam as sociedades latino-americanas, conforme alertava Celso Furtado (1992; 1997; 1997ª, 1997b). As narrativas postas nos RRDH-AL não enfrentam os óbices ao desenvolvimento humano profundamente arraigados em tais parâmetros.

Tânia Bacelar de Araújo (2010ª) alerta para os equívocos de imaginar que há qualquer facilidade no processo de implantação de práticas participativas no âmbito local. Também nesses espaços, de acordo com ela, proliferam inúmeras formas de conflitos de interesses e de jogos de forças. Ela ressalta que toda e qualquer ação, que traga no seu bojo a ambição de instituir a participação e a justiça social, enfrentará inúmeras formas de resistência, podendo produzir conflitos de diversas naturezas. Conforme foi demonstrado no decorrer desta análise, as narrativas e os argumentos postos nos RRDH-AL não lidam, a contento, com tais conflitos e resistências.

Bacelar de Araújo demonstra que o entendimento dos jogos de forças indicadores desta ou daquela direção aos processos de construção de demandas e de agendas participativas passa pelo desvendamento, em contextos sociais e históricos específicos, da diferença entre quem está à frente das instâncias político-administrativas e quem, de fato, são os detentores do poder. Muitas vezes, estes últimos resistem a toda e qualquer mudança com vistas a construção de projetos inclusivos. “A resistência das classes dominantes a toda mudança capaz de pôr em risco seus privilégios” (Furtado, 1979, p.1) está na essência da concentração da riqueza e do poder no Brasil.

Os formuladores dos RRDH-AL não se atêm ao patrimonialismo que tem estado no centro dos muitos enfrentamentos políticos contrários à participação cidadã e à construção de espaços democráticos para o estabelecimento de ações e práticas em favor da justiça social e do combate à pobreza e às desigualdades. Tânia B. de Araújo (2010) considera que a herança deixada pelo patrimonialismo pesa demais contra os projetos inclusivos que se tenta levar a cabo nos espaços territoriais locais.

E o mais grave de tudo isso, destaca Bacelar de Araújo, é que as diversas organizações sociais podem ser cooptadas por lógicas clientelistas e personalistas, alimentadoras do patrimonialismo e de seus tentáculos que se estendem do poder central ao poder local. Ela não está dizendo que não há, então, solução. Claro que há; o caminho, porém, é longo, árduo e de muitos enfrentamentos. Tais caminhos parecem simplificados nos documentos investigados.

O processo de geração da participação não é linear, nem mesmo possui uma única diretividade, pois que, a qualquer momento, ele pode ser revertido pelo aprisionamento –nas teias patrimonialistas– dos agentes, potencialmente aptos para atuar em favor da participação. Um caminho para ir tentando se livrar destas últimas, é “a montagem de fóruns e instrumentos de participação democráticos e transparentes onde os interesses possam ser explicitados e tratados coletivamente” (Bacelar de Araújo, 2010, p.210). Fica, então, evidente que os processos políticos locais são muito mais complexos e difíceis do que aqueles narrados nos RRDH-AL.

 

 

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1 Doutora em Sociologia pela Universidade de São Paulo (USP). Mestre em Ciências Sociais pela Pontifícia Universidade Católica de São Paulo (PUC/SP). Docente-investigadora dos programas de pós graduação em Ensino de Sociologia e Comunicação Popular e Comunitária (UEL). Universidade Estadual de Londrina, Paraná, Brasil. Correio eletrônico: mjderezende@gmail.com

2 Os relatórios globais do desenvolvimento humano começam a ser publicados em 1990. São anuais e tratam de diversos temas, tais como: participação política, democracia, mercado externo, pobreza multidimensional, desigualdades, trabalho, políticas sociais, educação, globalização, meio ambiente, entre outros.

3 São produzidos, pelo Programa das Nações Unidas para o Desenvolvimento (PNUD), além dos relatórios globais, também os relatórios por continentes, ou parte deles, bem como os relatórios por países. Há documentos que tratam da América Latina, da África, da Ásia, do Leste Europeu etc.

4 Sobre a atuação de Tânia Bacelar como consultora junto a organismos internacionais, ver: (Cofecon, 2018; Ceplan, 2012).

5 O Plano Brasil Sem Miséria foi um programa social criado no governo Dilma Rousseff na segunda década do século XXI. Ele era composto de três eixos articuladores: acesso à renda, a serviços públicos e a processos de capacitação inclusiva no mercado de trabalho.

6 Esta palavra é uma forma de assinalar as imprevisibilidades presentes nos processos participativos.

7 Orlando Fals Borda (1990, p.89) afirma que essa proposta dialógica, por ele mencionada, “se propuso primero el Brasil”, por Paulo Freire.

8 Organização Internacional do Trabalho.

9 Organização das Nações Unidas para a Educação, a Ciência e a Cultura.

10 Sobre isto, ver: (CIRILO, 2014).

11 No direito “a subsidiariedade é a técnica de aplicação de leis que permite levar para o âmbito trabalhista normas do direito processual comum” (Schiavi, 2015, p.3).

12 Sobre a perspectiva escalar nos debates sobre desenvolvimento, ver (Brandão e Siqueira, 2013; Klink, 2013).

13 Neste caso específico, há procedimentos de engenharia social quando as ações são, previamente, planejadas, conduzidas e executadas para alcançar metas e objetivos, muitas vezes definidos, sem se ater a complexidade dos contextos sociais, políticos, econômicos e culturais impeditivos no concernente aos saberes, conhecimentos, aspirações e relações de poder.